Muros da minha mente

Entre muros da minha mente habitam grandes animais que vivem por lá e morrem, dia após dia, para renascer em algum momento inesperado.

São eles: focas, corujas, gatos e, principalmente, baleias.

Entre muros da minha mente vivem as baleias.

Grandes, gordas, folgadas e com uma grande quantidade de gordura para queimar. Pensam em comer o tempo todo, mas passam grandes quantidades de tempo sem comida. Nadam pelo meu cerebelo, nas entranhas do meu cérebro, transitando entre os lados e o meu córtex frontal. As baleias soltam o ar pelos espiráculos quando tentam fugir da minha cabeça. Eu fico puto. As baleias vivem felizes dentro dos muros da minha mente.

Entre muros da minha mente também vivem gatos. Vivem alguns peludos e outros sem pelo nenhum. Eles mijam pelos cantos da minha cabeça e escondem as merdas que vivem fazendo quase na medula espinhal. É difícil de achar. Eles mostram a face fofa e ronronante antes de fugir para passarem a noite fora dos muros da minha mente.

Entre muros da minha vida vivem corujas também. Elas ficam lá de noite, de olho aberto no lobo occipital. Saem vez em quando para caçar roedores e outros pensamentos apodrecidos que estão perdidos em algum lugar entre o corpo caloso e o sulco cingulado. Vive nos becos da minha mente, nas curvas mais remotas e escuras. Suas vidas são boas e profícuas. As corujas vivem felizes dentro dos muros da minha mente.

E lá estão as focas dentro da minha cabeça. Seus bigodes longos fazem cócegas na minha medula. Um bando de focas gordas e preguiçosas brincam sem medo de nada, pois não têm predadores neste grande paraíso focal. São belas, rápidas e extremamente precisas quando querem, mas querem pouco. Querem menos, cada vez menos. Acreditam que o oceano por onde nadam não vai lhes prover a continuidade da espécie. Se conformaram com isso faz uns anos e agora apenas aproveitam o dia a dia brincando entre elas para embaralhar tudo o que é possível dentro de seu habitat.

As focas vivem felizes dentro do muro da minha mente.

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Suplica do eu bucólico

Nutritivos estofos de paisagem

na cria mansa da grama verde 

no mato preso da rica cerca

Na trava turva do trevo preto.

Montam-se cavalos de crinas secas

Onde o sol é verve da natureza

Os pelos ouriçam no tato estranho

Do chão por onde todos eles se foram.

Os caminhos do barro aprumam o solo

montes de chão formando altitude

Subindo ao céu terra sobre terra

Grão em grão ao topo da montanha.

Acidente que dorme, incha, fende e racha

Que marca a terra de identidade

E mancha o pé, a pele, a alma

Eterna suja de memória estranha.

São caminhos encruzilhados

Farpados arames na linha burra

Verdes de verdes do branco ao preto

Buracos profundos da terra escura.

Sou eu, desgraça profunda do meu eu

Ali, no cerco de onde não saio.

Sou eu ali de onde não saio

Relinchando alto para que só eu me ouça.

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Lá bem longe

Afasto de cada metro, de cada quilômetro, de cada dia. De contagens sem número que me mantém longe dos traços mais sinceros de quem eu sou. Dos meus pedaços, das minhas fotos, de meus sentimentos mais frágeis. Afasto dos eixos do meu corpo, do próximo retorno, da algoz falta que me fazem. Fujo da realidade escancarada que não quero ver e nem saber o que se tornaram.  Moro no beco, no escuro da minha imaginação, onde recrio os próprios personagens da minha vida. Limito suas histórias, os faço melhores que são e assim se tornam maiores e mais íntegros, mais inteligentes e com mais sentido dentro da vida que escolhi pra mim. Sou egoísta, pois prefiro que eles vivam do jeito que eu acho melhor. Não do jeito deles ou do jeito que a vida os fez. Do meu jeito, com a minha poesia e com o mesmo infantil e inocente traço que os desenho como vítimas da minha saudade. Assim os mantenho longe e os guardo dentro de uma caixa que mora dentro de mim. Abro de vez em quando, olho, remexo e volto a fechar com a esperança equilibrista de tentar me adaptar ao que um dia chamei de amizade.

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Antes do fim do dia

O sonho da palavra plano, da textura hoje, do fevereiro pródigo. A casa do amor amigo, do intestino aflito, da namorada longe. O peito do colega ausente, sob a mira à frente de um terço só. Escreve a letra fria sob panos quentes e derrota os males que invadem tristes a cabeça oca. Impera nos dedos duros os sentimentos trêmulos que não seguram seu coração. Bate, volta, ruge e torna possível a mágoa dilacerada de anos longos e piadas prontas. Força o ritmo, esquece a missa e se torna o milagre da sua própria existência. Levanta os mortos, mata os vivos, chora os amigos e dá asas à sua falsa eternidade. Solfeja os sonhos, alimenta o ego e descobre a realidade picada num pedaço velho de papel sujo. Sua alma entrelaça o travesseiro fofo da cama dura e permanece vegetativo sob o lençol que cobre aquilo que você não quer ver. Seu corpo é morto pela sua própria cabeça, que não move mais suas pernas, seus braços e nem seu pau. Em meio ao fevereiro pródigo, de textura hoje, este é o plano pra palavra sonho.

Whatever dream.

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Sobre terças-feiras às 15h.

3 da tarde. Eram 3 da tarde. Entrou num amorfo simpático a luz de uma primavera hostil. Entrou e me disse o horóscopo mais triste, mais pessimista que já se viu. Rimou, irritou e mostrou o destino visto pelas palavras que tanto aprecio. Não curti, não sorri, não me senti útil. Me conduziu a um estado adorno, daqueles que enfeitam os sentimentos que se lê nas palavras. Chuva. Só repeti com a estratégia do corpo as figuras tão conhecidas de uma pessoa ansiosa. Reli, ouvi música, andei de um lado para o outro. Senti paz por momentos em músicas e melodias que fizeram sentido. Rejuvenesci. Uma mágoa distante bateu em riste na membrana mais profunda da mente que se diz ágil. Frio. Criei, sob circunstâncias babacas, teorias acerca da mortalidade. Vivo ou morto, acresço sob formas estranhas e mereço de prontidão a mais recíproca condenação de ódio que já se viu. A noite cai, a lua invade, a escuridão enobrece. Encontro no vazio a mesma teoria mística que todas as palavras insistem em dizer coisas que não dizem nada.

Assim como este texto.

Perdão.

Whatever Sorry

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Intervalos sobre o mesmo tema

A gente vive num interlúdio. Dois atos principais, naquela meiuca de poucas palavras e beijos intensos. Naquela conversa em meio ao barulho de todas as pessoas. Sem muita música, sem espaço pra tanta poesia. Sem a intensidade devida, sem os acordes certos.

Você não está comigo no refrão. Não está comigo quando tudo explode num mar de felicidade ou naquelas tristes palavras que fazem tudo se arrepiar. Vivemos nos meios, nas pontes, nas modulações que tornam a música especial. E a gente sempre sobe o Tom, numa ausência tua difícil de aceitar, numa eterna espera de viver ao lado teu.

Quantos atos, quantas estrofes a gente vive pra chegar no refrão, pra chegar ao fim da música. Me deito na cama solfejando essa letra e tentando entender o fim. Vejo você ali, sinto sua pele e seu cheiro. Tento entender o começo. Tento entender o que o autor quis dizer com a palavra saudade que é recorrente em tudo que é frase. Me pego dormindo acordado, vivendo momentos que não aconteceram, imaginando outros finais, conjecturando tudo que ainda vai acontecer. E, mais intensamente, me pego tentando entender se eu devo interferir na letra, na música, no arranjo. 

Tento ser o autor da nossa música, alterando a letra, os sons, a melodia. Sou o compositor frustrado por nunca acabar a obra. Sou o compositor desesperado porque apenas as minhas frases não fazem um fim ou um novo começo. Não sei suas frases, suas intenções, seus tons e mil dons geniais. 

Sou só a metade.

A metade de todos os sons que já fizemos.

Serei a metade dos sons que virão.

Que assim seja. E que seja logo.

Whatever happens.

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I’ll miss u

Entre as portas do amanhecer e as ondas da escuridão a minha vontade permanece no limiar da luz. Penumbra de amor, vontade de estar junto. Entre a ignorância do sentimento e a racionalidade do encontro, permaneço com o coração justo, apertado, meio doído. Vergonha do sentimento, insegurança do contato. Vivo dias naquele lusco fusco do tempo, quando já se sabe que a noite chega, mas se quer viver o dia. O adeus mais próximo, o fim de uma coisa que nem começou. O medo da escuridão, do vazio profundo que é completado com doses cavalares de todas as coisas que não são você. Doses cavalares de toques e beijos que não são os seus. Naquela despedida, à meia luz, sorrio de canto de boca, pisco profundamente e descubro, neste momento, que quero viver no escuro. Não na escuridão, mas no escuro dos olhos fechados, rindo com o coração e com a boca colada nos seus mais profundos e sinceros goodbyes.

Whenever You Come Around

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Foco

Entrou a noite de bolinhas brancas

num quarto escuro à meia luz

introduziu nuances de cor com feixes de luz autônomos

sem muitas imagens e nem pessoas

atravessou a sala entre os móveis

ziguezagueando entre as roupas jogadas no carpete encardido

invadiu as pressas meus olhos e pupilas

que procuravam sentido no lusco-fusco.

E, sob a égide da máxima escuridão,

a luz apareceu dando alimento ao que mais aprecio na vida: a falta de foco.

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Olho do umbigo

O olho cansado, a pele exausta, a cabeça ferida. Entre as peles do corpo estão órgãos maculados de inocência, respeito e sofreguidão. Sua intenção clara, amorfa, paciente, seduz até a mais voraz e dedicada espécie de gente. Retrato capaz de incentivar a mordaça de todos os detentores da hipocrisia do amor. Seu perfil inerte e sedutor traduz em suma a riqueza e a veracidade daquilo que sempre buscou, por mais contumaz que todas as atitudes simulem. Entre o parto do ato, a ansiedade da denúncia, a iminência da declaração não sobrepujam maiores incidências. Estas são meras fagulhas de ardor que proliferam entre todas as pessoas que se tornam mais pessoas por conta de outras pessoas. Todos nós.

É oca, tola, perspicaz porém. Sua anedota sangra por entre os olhos raivosos diante da passividade do sexo oposto. Suas mãos suam por entre as rugas e cortes da sua vida já um tanto desgastada. Seu temor é visível nas ancas, nas pernas e no colo, por mais adornado que lhe pareça o espelho. Nada esconde mais o pavor da solidão. Nem mesmo o silêncio de um bom livro e o tilintar da sua taça de vinho.

Whatever I’m talking about

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Instrospecção

Aquela alma calma, recôndita e serena entre a pessoa translúcida e a fraqueza aparentemente estúpida mostra a riqueza da face obscena. A espera descansa e esbanja na letra aquilo que prova que a magia é maior e mais latente que qualquer anomalia. Entre as frases tristes, chorosas, se vê um mundo de outras coisas claramente menos enigmáticas. Entender as palavras é fácil. Entender a alma humana é complicado, mas é uma das coisas pra qual mais tenho talento na vida. Acredito nisso piamente.

Whatever comprehension

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