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Se essa rua fosse minha (ou pelo menos se eu tivesse controle)…

Naquela rua branca eu desfilei meus sapatos de sola preta. Deixei pegadas por toda a extensão, seja de comprimento ou largura. Seu céu branco também ficou poluído com a fumaça cinza do meu cigarro ou com a sedução vermelha da minha vontade. Minhas cicatrizes se fincaram no seu corpo e minha ansiedade me afastou de sua infantil e ingênua forma de ser.

A imagem que tenho ainda é de um mundo todo branco, como se eu pudesse ver neve no céu. Mas a minha cobiça, por mais que eu tente, é de ver as coisas mais escuras, complicadas e fora do meu alcance. Essa é a minha dura realidade. É onde me sinto liberto, me sinto à vontade com a minha sanidade e com medo de descobrir que o mundo não se contenta com o meu humor num domingo de manhã. E me dói a falta de paixão, o coração de concreto e a racionalidade exagerada que me invade de vez em quando.  Sou muito mais da metade feito só de coração, mas tenho um pouco menos da metade de um sentimento imaturo e falacioso que corrompe as minhas mais sinceras relações.

Aprendi a ser sincero, sabe Deus como. Aprendi a decorar essa rua branca com um monte de cores que só vivem dentro da minha cabeça e que, sem mais nem menos, se vão de forma lancinante. Não aprendi ainda a lidar comigo e nem a fazer as pessoas não sofrerem, como eu sempre quis.  Decoro a minha rua, por mais branca que ela seja, da maneira que me convém e faço a decoração sumir da mesma forma fácil e dócil que perfaço a vida. Azar ou sorte dos que me cruzam, amor ou ódio dos que me permanecem. Na minha rua branca, branquinha, está guardado um enorme e pulsante pedaço de mim. Meu maior pedaço e por poucas vezes tocado, apesar das constantes batidas que a inércia lhe dá por minuto. “Ó pedaço de mim, eu não quero levar comigo a mortalha do amor. Adeus!”.

Whatever NOPE.

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Hipocrisia: uma colher de humanidade!

Todos nós, hipocritamente, condenamos a hipocrisia. E somos todos, em algum grau, hipócritas condenáveis. Gosto quando as pessoas são hipócritas comigo e me cumprimentam com a maior alegria do mundo, quando o real e sincero desejo é que eu caia num bueiro, na melhor das hipóteses. Essa “falsidade” demonstra, ao menos, que, apesar da ânsia alheia pelo insucesso, ainda há um pouco de educação e admiração aos malquistos. Não que eu me importe com isso, mas uma crítica desfavorável é mais bem-vinda quando não se está presente. Isso é fato.

Outro fato indissociável da hipocrisia é a falta dela. A mais absoluta sinceridade é muito cruel e não traz benefícios a ninguém. Uma pessoa “verdadeiramente sincera” vive angustiada pela possibilidade de descobrirem o hipócrita que ele é. A hipocrisia foi criada como compensação à própria humanidade, como uma proteção aos desumanos que somos. Desde a mais tenra infância somos criados e educados a mentir para o bem alheio, a gostar da tia chata, da vizinha sebosa, do colega escroto e da professora estúpida. Por quê?

Todas as vezes que fui sincero quando era criança fui punido de alguma forma, seja quando ateei fogo na sala de aula e fui suspenso ou quando contei a maior mentira do mundo ao meu amigo e fiquei de castigo. Ser sincero é depor contra a própria pessoa, taí o bafômetro que não me deixa mentir, literalmente.

Cheguei a conclusão que nosso percentual de bondade é extremamente reduzido, o que nos torna sensível e crítico ferrenho a quase tudo que nos cerca. Descobri também que para não sair por aí dando gritos, porrada e xingando todo mundo com olhar de ódio é preciso adestrar ao máximo a nossa capacidade de hipocrisia, até a perfeição total. Que fique bem claro que a hipocrisia não é sentimento, é uma proposta humana dotada de razão, mesmo quando há falta dela. É uma atitude em relação ao sentimento, uma forma perfeita do que o ser humano deveria ser e não é, mesmo fingindo.
Sonho com o dia em que me tornarei o hipócrita mais sincero que já se viu.

Agora, sinceramente, quantas vezes você foi hipócrita hoje?

Whatever soap opera

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