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Lá bem longe

Afasto de cada metro, de cada quilômetro, de cada dia. De contagens sem número que me mantém longe dos traços mais sinceros de quem eu sou. Dos meus pedaços, das minhas fotos, de meus sentimentos mais frágeis. Afasto dos eixos do meu corpo, do próximo retorno, da algoz falta que me fazem. Fujo da realidade escancarada que não quero ver e nem saber o que se tornaram.  Moro no beco, no escuro da minha imaginação, onde recrio os próprios personagens da minha vida. Limito suas histórias, os faço melhores que são e assim se tornam maiores e mais íntegros, mais inteligentes e com mais sentido dentro da vida que escolhi pra mim. Sou egoísta, pois prefiro que eles vivam do jeito que eu acho melhor. Não do jeito deles ou do jeito que a vida os fez. Do meu jeito, com a minha poesia e com o mesmo infantil e inocente traço que os desenho como vítimas da minha saudade. Assim os mantenho longe e os guardo dentro de uma caixa que mora dentro de mim. Abro de vez em quando, olho, remexo e volto a fechar com a esperança equilibrista de tentar me adaptar ao que um dia chamei de amizade.

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Da onde viemos?

Plantei gerúndios e nasceram orgasmos. Pensei em criar filhos em amplas liberdades e nasceram alguns tabus dos mais engraçadinhos. Ponho na terra, rego e adubo, e, no final, nascem folhas tortas, secas e não tão belas, apesar de sempre florir de vez em quando. Entre o ontem e o amanhã há esse istmo que chamamos de hoje e que precisa ser preenchido com dores, alegrias e perseguições.

Fui formado por muitas pessoas, distintas e parecidas, bem intencionadas e incidentais, pessoas mortas e as mais vivas que conheço. Mas como distingui-los, se são todos homens e nascem todos iguais perante a nossa consciência? Há tempos que viajo com sacrifício para o prazer e a leviandade e quando chego só encontro deveres e cobranças. Minha formação se deve a essa multicolorida sensação de minutos diferentes e prestações infinitas, pagas, até certo ponto, com muito prazer.

Como era verde o meu jardim e azul o meu céu e branco o meu pensamento. Fui sendo moldado e escrito pela ordem das coisas e pelos sonhos e intenções dos que me cercam e que impõem responsabilidades. Essa relutância que insisto em manter e empregar como algo mundano e essencial é a parte sincera e intragável da minha personalidade.

Os risos e os tapinhas nas costas formaram muito menos o meu caráter do que as noites de dor e de vergonha que passei no escuro com as mãos divididas entre tapar os olhos ou fechar os ouvidos.

A sabedoria proverbial não sabe o que a espera e eu não quero mais encontrar a verdade que me embarga os passos e me tolhe os prazeres dessa vida intransigente. Tento ser o mais verdadeiro a cada dia que passa e luto incessantemente para clarear as muitas sombras que ainda restam de batalhas passadas. Não quero perder as derrotas e nem ficar revivendo as vitórias.

A magnitude de tudo isso é ver com os próprios olhos e o coração alheio que você cria exatamente o que você é. Não assim, sozinho, mas com ajuda impertinente, irresponsável e extremamente prazerosa das relações humanas.

Agora eu sei com quantos pais se faz uma pessoa. Obrigado a todos vocês.

Whatever: thanks

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